terça-feira, 21 de junho de 2011

O que pensavam os novos ministros quando não sabiam que iam ser ministros

São quatro os independentes do novo governo PSD/CDS, todos com opinião publicada, editada ou manifestada sobre as áreas que agora vão liderar. Aqui apresentamos as principais linhas de pensamento dos novos ministros, ideias forjadas quando ainda não sabiam que o futuro lhes reservava poder fazer o que diziam.
Nuno Paulo de Sousa Arrobas Crato
Mais exames nacionais. O novo ministro da Educação, do Ensino Superior e da Ciência considera que os professores devem ser avaliados com base na evolução dos resultados dos alunos nos exames nacionais, propondo por isso a realização destas provas no final de todos os ciclos de ensino. Esta foi uma das ideias defendidas por Nuno Crato no Fórum Portugal de Verdade, organizado pelo PSD em 2009.
Crato defende que os professores devem ser “avaliados com base nos resultados” dos alunos e criticou repetidamente o facilitismo nos exames nacionais. “Só há uma maneira de fazer isto que não signifique inflação nas notas. Uma avaliação externa” das provas, afirmou.
O novo ministro defende também mudanças na estrutura do Ministério da Educação, com a extinção, por exemplo, do GAVE (Gabinete de Avaliação Educacional), tornando-o um gabinete independente. Nuno Crato sugere que poderá ser tutelado por uma empresa privada, à semelhança do que acontece nos EUA, ou por uma universidade, como em Inglaterra. “Não são precisos muitos decretos para fazer isto, não é preciso muita coisa. É preciso um ministro que tenha a coragem de chegar e dizer ‘o gabinete de avaliação educativa está encerrado’”, assegurava o novo ministro no mesmo fórum.

Os programas escolares não devem ser feitos pelo Ministério da Educação, acredita ainda Nuno Crato, que diz que o ministério só deve dar indicações-padrão: objectivos concretos relativos ao que cada aluno deve ficar a saber no final de cada ciclo. O ministro defende uma maior autonomia das escolas e acredita que o ministério não pode ter “a educação como sua pertença”. A passagem para as aulas de 90 minutos foi dada como exemplo por Crato, que defende que os horários escolares devem ser geridos pelas próprias escolas: “Não percebo como nenhum partido disse ‘o que é que o Ministério da Educação tem a ver com isso?’”. 
A formação de novos professores é uma aposta “fundamental”, segundo o novo governante, que defende um exame de acesso à profissão. Matemático e professor universitário, Nuno Crato tem para já “expectativas positivas”por parte do Sindicato Nacional do Ensino Superior e as reticências da Fenprof: “Não é um nome que nos descanse”, afirmou ao i o secretário-geral, Mário Nogueira.

Paulo José Ribeiro Moita de Macedo
Do conjunto de independentes do novo elenco, é o que menos divulgou o que pensa sobre o sector que vai tutelar. Sabe--se apenas que o ex-homem forte dos impostos, e que foi administrador da seguradora Médis, quer que os portugueses deduzam menos despesas de saúde em sede de IRS. Defendeu-o em Fevereiro numa conferência na Universidade Católica. Para um aumento da receita fiscal, Macedo propunha uma redução dos benefícios fiscais e das deduções.
Mas essa será uma tarefa nas mãos do ministro das Finanças e que está prevista no acordo com a troika. A diminuição das deduções em saúde foi um dos cavalos de batalha de Passos Coelho nas negociações com o governo para a aprovação do Orçamento de 2010.  
Sendo um homem de números, Macedo tem apresentado mais propostas relacionadas com as Finanças. Para pôr a casa em ordem aconselhou uma prestação de contas por ministério, fazendo depender o aumento da competitividade da redução de custos com pessoal e juros.

Vitor Louçã Rabaça Gaspar
Vítor Gaspar é o principal ministro do governo PSD/CDS – e aquele sobre o qual os portugueses menos sabem. É um economista e académico puro, cuja carreira de duas décadas teve um objectivo central: o euro. Ohomem que tem por missão cumprir a mais dura consolidação orçamental para evitar o risco de uma saída forçada de Portugal da moeda única é um defensor radical da mesma – é, na Europa, dos economistas mais comprometidos com o projecto.
“Com uma carreira à volta da integração monetária europeia eu não reclamo um ponto de vista de espectador imparcial”, disse há um ano numa intervenção no Porto, citada pelo blogue Massa Monetária. “Recentemente fiz um discurso na Reserva Federal de Dallas com o título ‘A segunda década do euro: o sucesso continua!’ O organizador estava bem ciente da minha parcialidade.” 
O agora ministro acompanhou as negociações portuguesas no âmbito do Tratado de Maastricht, criou e liderou o departamento de investigação do Banco Central Europeu e liderou o grupo de conselheiros económicos do Presidente da Comissão Europeia. (Vítor Gaspar não foi reconduzido no cargo no segundo mandato de Durão Barroso por ter sido considerado demasiado teórico, apurou o i – a recomendação terá vindo de António Nogueira Leite e não de Barroso).
O percurso de Portugal com a moeda a que o novo ministro das Finanças dedicou a carreira tem sido muito difícil. O novo ministro das Finanças reconheceu isso mesmo há cerca de um ano na apresentação de um livro publicado pelo Banco de Portugal. Vítor Gaspar, tal como o seu colega na pasta da Economia, reconhece o desequilíbrio  orçamental português, mas enquadra-o num contexto mais amplo. Nessa mesma apresentação – feita com rigor e subtil sentido de humor – Gaspar deu a sua opinião sobre os maiores desafios da economia portuguesa: “Crescimento da produtividade e competitividade”, “crescimento sustentado e criação de emprego”, “correcção dos desequilíbrios macroeconómicos fundamentais” e “reforço e generalização da concorrência e transformação da estrutura produtiva”. Muitas destas áreas são da responsabilidade de Álvaro Santos Pereira, que tem uma visão semelhante dos problemas – resta saber qual a opinião de Gaspar sobre a reestruturação de dívida (mal encarada pelo BCE, onde Gaspar tem um percurso significativo), vista como inevitável pelo seu novo colega. Certo é que ambos os ministros são uma opção coerente com o rigor e a agenda liberal impostas pelo programa da troika: defensores de mais concorrência, mais flexibilidade no trabalho e maior responsabilização individual. 
Como defensor do euro, Vítor Gaspar tem apontado para a necessidade do reforço da regulação e supervisão financeira (tarefas nas mãos de Carlos Costa, governador do Banco de Portugal, que declinou o convite para as Finanças). Com este perfil é de esperar que o novo ministro das Finanças cumpra e aprofunde os mecanismos de transparência das contas públicas em Portugal. A dúvida? Se o teórico do euro será capaz de suportar a enorme pressão política da pasta das Finanças.

Álvaro Santos Pereira
Álvaro Santos Pereira é um dos ministros menos conhecidos pelos portugueses – mas é o que mais claramente publicou em livros e blogues a sua opinião sobre aspectos-chave da pasta que irá liderar, a Economia. O novo ministro é uma escolha coerente com o programa liberal da troika, embora se distinga por algumas diferenças de opinião importantes, como a reestruturação da dívida ou a subida da carga fiscal.
Santos Pereira tem a dura tarefa de relançar o crescimento da economia, mas já admitiu que isso será difícil de conciliar com o pagamento integral da dívida pública. “O livro [“Portugal na Hora da Verdade”, publicado há um mês] mostra que as dívidas da economia nacional são de tal forma elevadas que será muito difícil evitar uma reestruturação a curto ou médio prazo”, afirmou ao “Expresso”. “Porém, tal reestruturação tem de ser devidamente negociada com os nossos credores e parceiros europeus e não deve ser feita de forma menos civilizada, como aconteceu em 1892.” 
O novo ministro terá de trabalhar em articulação com as Finanças e deverá pressionar para cortes suplementares de despesa que permitam reduções dos impostos. “Espero bem que o próximo governo consiga renegociar [com a troika] o aumento de impostos sobre as famílias e as empresas”, afirmou há semanas em entrevista à Antena 1. A sua preferência vai para a dieta no Estado, onde recomenda uma redução drástica, por exemplo, do número de entidades públicas (“entre 30% e 50%”, disse à TVI24).
Para crescer defende que a desvalorização fiscal (corte na taxa social única) é das medidas mais importantes – também aqui quer uma descida “drástica, entre 10 e 15 pontos” da taxa (mais em linha com o FMI que com o PSD, que tem falado de 4 pontos), compensada com cortes na despesa e subida do IVA (“as taxas reduzidas devem subir”). 
Também inevitáveis são as privatizações – na pasta da Economia e Obras Públicas terá nas mãos a TAP e os CTT –, embora admita que “há o risco de vender a preços de saldo” nesta altura. Sobre a Caixa Geral de Depósitos admitiu ao “Jornal de Negócios” que “a médio ou longo prazo, faz sentido equacionar uma privatização total da CGD”. O ministro é muito crítico da opção pelas parcerias público-privadas, várias das quais nos transportes, área sua.
Fonte: jornal i

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