quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

Cavaco, o arrogante

Cavaco Silva nunca põe o debate no campo da discordância política. Cada critica é um ataque que resulta de falta de caracter ou de ignorância. Todos, a não ser ele próprio, claro, padecem de um desconhecimento geral e absoluto da forma como "as coisas" funcionam. De como funciona a diplomacia, de como funcionam as instituições, de como funciona a economia, de como funcionam os mercados. Na realidade, as coisas são como são e Cavaco Silva limita-se a fazer uma leitura (sempre sem duvidas e sem enganos) de como as coisas são e a agir em conformidade.
Cavaco Silva sempre fez escolhas políticas. E sempre disfarçou essas escolhas com uma suposta neutralidade técnica. Tem sido esse o caminho da Cavaco desde o começo da sua longa carreira política: fingir que é um técnico nas opções políticas que vai fazendo.
Talvez um dos casos mais evidentes seja a sua reacção a qualquer crítica à desregulação dos mercados. Nessas críticas Cavaco vê insultos. E inventa uma fábula: transforma os mercados numa espécie de entidade dotada de personalidade própria e imagina que, a essas críticas, os mercados, ofendidos, reagirão com uma birra. Desta novidade na teoria económica resulta a interdição geral em ter posições políticas sobre a actual situação da Europa e da economia internacional. Restaria assim, ao Presidente, ficar calado. E agradecido a quem especula com a nossa dívida, claro.
Para além dos estilos diferentes, a grande diferença entre Manuel Alegre e Cavaco Silva, no debate de ontem, foi exactamente esta. Cavaco Silva nunca disse o que realmente pensa sobre coisa alguma. Resumiu tudo ao seu suposto superior conhecimento de tudo o que mexe. E perante o seu génio, nada merece realmente ser discutido. Manuel Alegre fez o que se espera de um candidato em campanha: deixar claras as suas posições políticas, sem pedir cheques em branco a ninguém.
Cavaco quer passar a ideia de que um cargo exclusivamente político é, na realidade, um cargo técnico. Como não tem os instrumentos constitucionais para aplicar nenhum dos seus supostos - mas raramente confirmados - méritos técnicos e não diz o que pensa politicamente sobre quase nada esvazia, aos olhos dos portugueses, o cargo do Presidente. Bom para transformar o dia 23 de Janeiro num plebiscito.
Na realidade, trata-se de um falso esvaziamento. Como se tem visto nas posições que tem tomado - sem no entanto usar os instrumentos que a Constituição lhe oferece -, quando discorda de uma lei, faz-lhe críticas públicas, fragilizando-a. E aí, toma uma posição política. É legítimo. O que é ilegítima é a ideia que tenta passar de que é politicamente neutro. Não é.
O mesmo tipo de dissimulação foi feita por Cavaco Silva, no debate de ontem, em relação a todos os reparos ao seu mandato. Sobre o humilhante caso dos insultos do presidente da República Checa a Portugal e sobre a rocambolesca novela das falsas escutas a Belém não esclareceu coisa nenhuma. Fez o que tem feito sempre: mandou ler o site da Presidência da República onde nada é na realidade esclarecido. Sobre o caso BPN conseguiu a proeza de criticar a actual administração do BPN depois de ter passado meses a defender o seu amigo Dias Loureiro, um dos principais responsáveis por o que aconteceu à SLN. Digamos que quem andou a defender o responsável pela doença tem pouca legitimidade para criticar o médico.
Acabados os debates, há pelo menos um ponto em que Cavaco Silva leva o troféu: um dos políticos mais arrogantes que a nossa democracia conheceu. Nesta matéria, talvez só seja mesmo acompanhado por José Sócrates. O que não deixa de ser interessante: com duas pessoas tão iluminadas e autosuficientes à frente dos destinos deste país, porque estamos como estamos?

Texto de Daniel Oliveira

sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

Os milhões de uns impõem tostões a outros


Foi assim que, segundo o Tribunal de Contas, o Governo PS aplicou 2.2 mil milhões de euros para combater a crise: 61% para a banca, 36% para as empresas e 1% para o apoio ao emprego. Esta distribuição é tão justa e tem surtido tanto efeito que ainda o ano não acabou e já se anunciam mais 500 milhões de euros para continuar esse desígnio nacional de salvar o BPN. Na verdade, o BPN não deveria sequer ser colocado no mesmo saco dos outros bancos. Afinal, quando um banco nos custa cinco mil milhões de euros a gente acaba por se afeiçoar a ele. Além do mais, este é o banco em que Cavaco Silva nunca meteu um único dedo. E por isso disse de peito feito: «Nunca comprei nem vendi nada ao BPN». É a chamada verdade da mentira. Cavaco Silva nunca comprou nada ao BPN, mas o mesmo não se pode dizer relativamente à SLN (Sociedade Lusa de Negócios), que por acaso até era proprietária do BPN e administrada pelo seu amigo e Conselheiro de Estado José Dias Loureiro. Mas isso são pormenores sem importância nenhuma, assim como os 147.500 euros que realizou em mais valias. Há que ser esperto e saber vender a tempo. E deve ser motivo de orgulho ter um presidente esperto.
Está visto que os apoios às empresas foram insuficientes. Só isso justifica que estas não tenham conseguido realizar esse esforço inimaginável de aumentar o salário mínimo para 500 euros. E por isso é que nesse enorme esforço de concertação social foi conquistado um aumento de 33 cêntimos por dia, ou 10 euros por mês, para os trabalhadores e trabalhadoras que ganham o salário mínimo. Feitas as contas, dá para garantir que, numa casa de orçamento mínimo, este salário consiga cobrir o aumento anunciado do pão e que aí se continue a consumir, como se crise e amanhã não houvesse, até 16 moletes por dia.
As políticas de apoio à criação de emprego tiveram direito a 1%. É não só justo como suficiente. Afinal, Sócrates apresentou-se ao país anunciando que iria recuperar 150 mil empregos, nada tendo dito sobre aqueles que iria perder. O facto de haver 600 mil desempregados e desempregadas é apenas um pormenor. E, como se sabe, com esta gente todo o cuidado é pouco. Não se pode habituá-los a viver à gola do subsídio de desemprego porque para subsidiodependentes já nos basta o BPN.

Fonte: "Arrastão"

sábado, 4 de dezembro de 2010

A História repete-se

Jules Mazarin, nascido como Giulio Raimondo Mazzarino e conhecido como Cardeal Mazarino, nasceu em Pescina (reino de Nápoles) a 14 de julho de 1602  e morreu em Vincennes (França) a 9 de março de 1661,  foi um estadista italiano radicado na França.
Foi primeiro-ministro da França desde 1642 até sua morte. Mazarin sucedeu seu mentor, Cardeal de Richelieu. Era um notável coleccionador de arte e jóias, particularmente diamantes, e deixou por herança os "diamantes Mazarino" para Luís XIV em 1661, alguns dos quais permanecem na colecção do museu do Louvre, em Paris.
Jean-Baptiste Colbert, nasceu em Reims a 29 de Agosto de 1619 e faleceu em Paris a 6 de Setembro de 1683, foi um político francês. Foi Ministro de Estado e da Economia do Rei Luís XIV.
Instalou o Colbertismo na França, onde teve uma grande importância no desenvolvimento do mercantilismo ou da teoria mercantilista, bem como das práticas de intervenção estatal na economia, que o mercantilismo advogava.
Conta-se que estavam ambos em conferência a propósito dos grandes problemas que assolavam a França, nomeadamente, a profunda crise financeira de então, em que procuravam novas formas de financiamento para Estado.
O diálogo é o seguinte:
Colbert: Para encontrar dinheiro, há um momento em que enganar [o contribuinte] já não é possível. Eu gostaria, Senhor Superintendente [Primeiro-Ministro], que me explicasse como é que é possível continuar a gastar quando já se está endividado até ao pescoço...
Mazarin: Se se é um simples mortal, claro está, quando se está coberto de dívidas, vai-se parar à prisão. Mas o Estado... o Estado, esse, é diferente!!! Não se pode mandar o Estado para a prisão. Então, ele continua a endividar-se... Todos os Estados o fazem!
Colbert: Ah sim? O Senhor acha isso mesmo? Contudo, precisamos de dinheiro. E como é que havemos de o obter se já criámos todos os impostos imagináveis?
Mazarin: Criam-se outros.
Colbert: Mas já não podemos lançar mais impostos sobre os pobres.
Mazarin: Sim, é impossível.
Colbert: E então os ricos?
Mazarin: Os ricos também não. Eles não gastariam mais. Um rico que gasta faz viver centenas de pobres. 
Colbert: Então como havemos de fazer?
Mazarin: Colbert! Tu pensas como um queijo, como um penico de um doente! Há uma quantidade enorme de gente entre os ricos e os pobres: os que trabalham sonhando em vir a enriquecer e temendo ficarem pobres. É a esses que devemos lançar mais impostos, cada vez mais, sempre mais! Esses, quanto mais lhes tirarmos mais eles trabalharão para compensarem o que lhes tirámos. É um reservatório inesgotável...

E passados quase 400 anos, a história repete-se. Os que estão entre os ricos e os pobres continuam a pagar a crise...